Sobre o autor
Um dos maiores nomes da literatura brasileira, Ariano Suassuna nasceu em 1927, em João Pessoa, na Paraíba, e, em 1942, se mudou para Recife, Pernambuco, onde se formou em Direito. Romancista, dramaturgo, poeta e professor universitário, traduzido para vários idiomas, fundou o Teatro Popular do Nordeste e o do Movimento Armorial, em que buscou criar uma arte erudita brasileira com base na tradição popular. Eleito em 1989 para a Academia Brasileira de Letras, Ariano percorreu o país com aulas-espetáculos, que levavam a audiência ao delírio. Faleceu aos 87 anos, em julho de 2014, em Recife, a cidade que elegera para morar a maior parte de sua vida.
Tema de diversos estudos e teses acadêmicas, sua obra inclui romances, novelas e quase duas dezenas de peças teatrais, entre as quais A pena e a lei, de 1971, O santo e a porca, de 1964, e o Auto da Compadecida, de 1957, que seguem sendo simultaneamente encenadas por inúmeros grupos teatrais do país, e cujas adaptações para cinema e televisão obtiveram enorme êxito. A chegada das peças de Suassuna ao grande público não representou propriamente uma popularização de seu trabalho, mas uma consagração de sua popularidade. Se fosse realmente possível sintetizar sua extensa e produção artística, talvez se pudesse dizer que é ela uma síntese universal da cultura popular nordestina.
Em sua obra, Ariano revelava e refazia nexos nada óbvios entre a literatura de cordel das feiras do Nordeste e a literatura medieval portuguesa, ao mesmo tempo, em que reciclava recursos característicos do teatro grego e temas clássicos, sem abrir mão da expressão popular. Formado na escola sertaneja da privação, Ariano era econômico; o luxo de sua erudição sempre soava discreto, em textos limpos, simples, cômicos e invariavelmente comoventes. Lidas e encenadas em escolas de todo o país, as peças de Suassuna pertencem à memória de várias gerações. Suas personagens – santos, cangaceiros, palhaços, donzelas casadoiras, prostitutas, avarentos, ladrões, frades, juízes, vaqueiros e cangaceiros – revivem paixões de todos os tempos e lugares e ganham posto cativo no imaginário do leitor.
Para Suassuna, entretanto, foi no Romance d’a Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-volta (1971), reeditado pela Nova Fronteira em 2017, que sua literatura se apresentou mais acabada e completa. Classificado pelo próprio autor como um “romance armorial popular”, o livro funde mundos, numa espécie de realismo mágico sertanejo, onde diferentes tradições literárias se entrelaçam e as raízes medievais da organização social do sertão surgem, numa representação da própria fusão cultural brasileira.
Citações
“Extraordinário romance – memorial, poema, folhetim, que Ariano Suassuna acaba de explodir. Ler esse livro em atmosfera de febre, febril ele mesmo, com a fantasmagoria de suas desventuras, que trazem a Idade Média para o fundo Brasil dos novecentos, suas rabelaisiadas, seu dramatismo envolto em riso.
Ah, escrever um livro assim deve ser uma graça, mas é preciso merecer a graça da escrita, não é qualquer vida que gera obra desse calibre.”
Carlos Drummond de Andrade, poeta e escritor, sobre Romance d’A Pedra do Reino (Nova Fronteira)
“Ariano buscou a essência da alma e da linguagem do povo que ele conheceu. Misturou sua erudição com o falar e a sabedoria do homem nordestino. Como Cervantes, no meio de sua prosa admirável, colocou versos e poemas muitas vezes cortando o desenvolvimento de suas histórias. Fez uma genial paródia dos romances da cavalaria medieval.”
Carlos Heitor Cony, jornalista e escritor, sobre Ariano Suassuna
“Entremeado, todo o tempo, de símbolos e alusões, de recordações e fantasmas, poço inesgotável de estudos analíticos, livro de cabeceira para psicólogos e sociólogos, esse romance é uma explosão de maravilha. Não há que buscar nele o folclore, o regional, o ocasional, o circunstancial, e sim o universal, o permanente, como em Dom Quixote”.
Carlos Lacerda, jornalista e editor, sobre Romance d’A Pedra do Reino (Nova Fronteira)
“No caso de Suassuna, a identificação entre o homem e a obra parece tão siamesa que o fluxo popular do seu teatro […] e do seu romance não pode ser acoimado de atitude. Atitudes seriam, e menos graves, certas brincadeiras ou liberdades que o escritor toma em público, com o fito evidente de prolongar em sua pessoa o mito da obra.”
Hélio Pólvora, jornalista, escritor e crítico literário e de cinema, sobre Ariano Suassuna
“Ariano Suassuna é a prova de que uma cultura vasta e o conhecimento das grandes tradições da arte ocidental parecem ser a melhor base para a criação de uma obra essencialmente brasileira; nascido e criado no nordeste, sua obra dramática foi desde o início influenciada tanto pelo teatro de mamulengos e pela literatura de cordel, quanto por tudo que ele conhecia do teatro universal; e com o tempo Suassuna se dedicou fundamentalmente àquelas expressões de suas origens, integrando-as com as formas eruditas que lhe pareciam ser o melhor caminho para se conseguir estabelecer uma comunicação plena entre a riqueza regional e o total do Brasil contemporâneo.”
Barbara Heliodora, ensaísta, tradutora e crítica de teatro, sobre Ariano Suassuna
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Texto de Barbara Heliodora sobre Ariano Suassuna em O Globo